sábado, 24 de outubro de 2009

BUSCAR O DOCE

Buscar o doce onde o sal impera. No meio da dor, no calor do último abraço, na marca de sangue na parede.
Buscar o doce como quem nega o que não pode. O que não supera. Salgado viver. Tão cheio de pedras que não se dissolve nem quando se cercam de mar. Água salgada que banha o mundo.
Onde o doce senão nas frutas, nas flores, nos bicos dos pássaros? Na rapidez do vôo, na única floração do ano, na estação da colheita?
O doce tem hora. Momento certo. Como se recompensa fosse. Lembra das sobremesas. Dos docinhos nas festas de aniversário, contrabalançando o salgado do tempo que já se faz presente. Lembra o guaraná na casa do vô. Os caramelos. O bolo de milho na mesa sempre posta. Infância tem gosto doce? Ou o sal se impõe naquela mordida em que a língua sangrou e nunca mais se foi inocente. Quando se roubava dinheiro da bolsa da mãe pra comprar frumelo. E a mãe não percebia. Ou fingia não perceber. Assim, os crimes passaram em vão. Sem gosto algum.
Doce era ver pelas frestas, nas entrelinhas, ser mais sábio que os outros. Depois perceber que era de um doce amargo essa consciência das coisas. Antes não se provasse.
Buscar o doce onde o sal não impera. Talvez vivendo em outro mundo, outra galáxia, em um tempo ainda não criado.
Onde o sal não impera.
Quem dera existisse o brigadeiro absoluto.

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